quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Händel: Messias - Parte I, 1-3: Abertura, Confort ye, Every Valley.

O Messias de Händel é, sem dúvida, um dos oratórios mais conhecidos -- se não o mais conhecido -- da nossa música ocidental. Mesmo aqueles que não têm muito contato com a nossa música clássica já ouviram o "Aleluia" de Händel.

Mercier: Retrato de Händel.

Georg Friedrich Händel, um dos mais importantes compositores do barroco, nasceu na Alemanha em 1685 -- mesmo ano em que Bach -- e aos 20 anos foi para a Itália: por três anos aprendeu e assimilou o estilo da ópera italiana. Em 1710 mudou-se para a Inglaterra, onde produziu a parte mais significativa de sua obra -- inclusive O Messias -- e virou George Frideric Handel. Lá permaneceu até sua morte em abril de 1759.

Com música de Händel e libreto de Charles Jennens, o Messias (Messiah, HWV56) foi composto no verão de 1741 e estreou no ano seguinte, em um concerto beneficente em Dublin, obtendo grande sucesso.Trata-se de um extenso oratório em três atos, que abrange toda a trajetória de Cristo. Segundo relatos, Händel teria levado apenas 24 dias para compor a peça.
As três partes (ou atos) do Messias são:
Parte I: A Anunciação
1: A profecia da Salvação
2: A profecia da vinda do Messias
3: Presságios para o mundo em geral
4: Profecia do concepção da Virgem
5: A aparição do Anjo aos Pastores
6: Milagres de Cristo
Parte II: A Paixão
1: O sacrifício, a flagelação e a agonia na cruz
2: Sua morte, Sua passagem pelos infernos, e sua ressurreição
3: Sua Ascensão
4: Deus revela a sua identidade no Céu
5: O início da evangelização
6: O mundo e seus governantes rejeitam o Evangelho
7: O triunfo de Deus
Parte III: O resultado
1: A promessa de redenção da queda de Adão
2: Dia do Julgamento
3: A vitória sobre a morte e o pecado
4: A glorificação de Cristo.

A gravação abaixo -- com o excelente tenor Paul Elliott e a Academy of Ancient Music sob a direção de Christopher Hogwood -- começa com a Sinfonia de abertura, da qual destacamos a fuga tipicamente barroca que pode ser ouvida após uma curta introdução. Aos 2 minutos e 50 segundos de gravação tem início o arioso -- algo entre recitativo e ária -- para tenor "Confort ye": um trecho do Profeta Isaías que diz
“Consolai, consolai o meu povo!”, diz o vosso Deus.
Falai ao coração de Jerusalém, anunciai-lhe: seu cativeiro terminou, sua culpa está paga, da mão do SENHOR já recebeu por suas faltas o castigo dobrado.
Grita uma voz: “No deserto abri caminho para o SENHOR! No ermo rasgai estrada para o nosso Deus!" (Is 40, 1-3)
Chama-nos a atenção, nesse clima quase solene de proclamação, a primeira frase a ser cantada, "confort ye", a forma como ela é reforçada, conforme será observado em outro vídeo adiante.
Aos 5 minutos e 45 segundos do áudio tem início a ária "Every valley shall be exalted", ainda para tenor. É a continuação do trecho de Isaías:
Todo vale seja aterrado, toda montanha, rebaixada, para ficar plano o caminho acidentado e reto, o tortuoso.(Is 40,4)
Aqui estão presentes os contrastes forte-piano típicos do barroco e os melismas, além das notas ascendentes e descendentes, que nos ajudam a visualizar os vales e montanhas do caminho que será aplainado. Quando o texto fala dos vales que serão elevados, primeiro as notas descem aos vales, depois sobem, o elevando. Já as montanhas são primeiro escaladas, depois rebaixadas. Também o acidentado e o tortuoso apresentam movimentos verticais das notas, enquanto que no plano há um longo melisma que muda de nota suavemente e com intervalos muito pequenos. Trata-se de um exemplo da aplicação da Teoria dos Afetos, bastante popular no Barroco. Os trechos da parte da voz, abaixo, ilustram de forma gráfica esses movimentos ascendentes e descendentes.  



 Vamos, agora à música!



Sobre o "Confort ye" que comentamos acima, segue o vídeo com comentário do maestro Trevos Pinnock. Um tanto lenta e quase romântica, com um tenor que está confundindo Händel com Wagner, não é, musicalmente, a nossa concepção preferida, mas vale a pena ouvir o que ele fala desse "confort ye", consolai, tão simples, três notas, e que tanto nos envolve.


No capítulo 3 do Evangelho de S. Mateus é anunciado que se cumpriu a profecia de Isaías:
"Apareceu João, o Baptista, a pregar no deserto da Judeia. Dizia: «Convertei-vos, porque está próximo o Reino do Céu.» Foi deste que falou o profeta Isaías, quando disse: Uma voz clama no deserto: Preparai o caminho do Senhor, endireitai as suas veredas."
O trecho de Orígenos, abaixo, nos lembra que a reflexão cristã na preparação do Natal não se deve resumir a rememorar um fato histórico ocorrido há mais de 2 milênios, mas, principalmente, a acolher a vinda de Cristo a cada dia em nossa vida:
"João batista dizia: «Toda a ravina será preenchida» (Lc 3,5), mas não foi ele quem preencheu todos os vales, foi o Senhor, nosso Salvador. [...] «E os caminhos tortuosos ficarão direitos». Cada um de nós era tortuoso [...] e foi a vinda de Cristo, realizada na nossa alma, que endireitou tudo o que o era."
Orígenes (c. 185-253), presbítero e teólogo


Após essas considerações, voltemos à música, agora com a versão em vídeo do áudio postado acima, porém sem a Abertura. Não escolhemos o vídeo de outra versão qualquer para postar aqui porque quanto mais ouvimos diferentes gravações do Messias mais nos convencemos da excepcional qualidade da de Hogwood.


Händel e o Profeta Isaías continuam:
A glória do SENHOR vai, então, aparecer e todos verão que foi o SENHOR quem falou!
(Isaías 40,5)


Voltaremos a esse belíssimo coral no próximo 'post', com a excelente versão de Hogwood.

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